quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Excelente Artigo na Scientific American Brasil Relata os Problemas no Ensino Superior do Brasil

Na Scientific American Brasil deste mês, um artigo muito bom do prof. Adonai. Ele relata os bastidores da educação superior no país, especialmente nas universidades públicas. Recomendo a leitura para todos aqueles que são alunos e docentes.  

Na minha opinião, que tive contato com bons e péssimos professores, não é surpresa. Vejo que o ensino no Brasil, há muito tempo, está muito mais voltado para uma carreira estatutária, como é a base do funcionalismo público no país. A partir da deficiência do ensino, é muito mais "fácil" seguir uma carreira acadêmica e realizar um concurso público de professor que encarar um concurso e ser técnico do tesouro nacional, por isso é comum encontrarmos professores desatualizados e que decretam o fim das suas carreiras de pesquisa quando obtém o diploma de doutor.  É bem verdade que não são todos que perdem o total interesse na pesquisa científica e principalmente docência, mais engana-se quem pensa que todos os professores em universidades federais são mal pagos, eles sabem muito bem como ganhar dinheiro as custas do contribuinte como os exemplos citados no artigo. 

O descaso com o ensino desde o planejamento e execução das aulas até a orientação do trabalho de conclusão de curso é muito grande e empresto aqui a minha visão, a partir das diversas discussões com docentes em listas e fóruns que participo ativamente desde 2008.
Por muitas vezes alguns alunos devem ter passado por uma situação a qual não conseguiam realizar todas as atividades práticas, porque não há tempo suficiente para estudar todas as disciplinas. Neste caso, foi preciso deixar de realizar algumas atividades para poder entregar outra, pois a carga horária de estudos foi superior ao planejamento (e.g. eu já tive 300 horas de atividades práticas num único semestre em uma disciplina). E se o aluno for reprovado em algumas disciplinas, principalmente nos primeiros semestres de um curso de graduação, de quem é a culpa, do aluno ou do professor?. A carga horária de estudos extra-classe é um planejamento sério, um professor que não lê o projeto pedagógico para entender a visão do curso e ter certeza que o conteúdo da disciplina irá cumprir com os objetivos gerais e específicos de formação do aluno, pode prejudicar diretamente os seus alunos. Se ao invés de planejar aderente ao projeto pedagógico ele ainda copia suas aulas da internet, de um curso que não possui objetivos relacionados com o da instituição, dificulta ainda mais a relação de aprendizado com as outras disciplinas do curso, pois existe uma matriz de componentes curriculares para que se possa aproveitar a relação de aprendizado entre esses componentes. 

Vários professores se dedicam ao planejamento dessa matriz antes de enviar uma proposta ao MEC (eu já participei de um planejamento desses e sei como é sério). 
Escrever apenas no planejamento de ensino que irá dividir a carga horária em 64hs teóricas e 8hs práticas (as 72hs comuns de cursos de graduação) e nem ao menos planejar as aulas é o primeiro erro. Muitos professores copiam planos de ensino um dos outros, porque muitos já nem desejam ensinar em um curso superior em instituições públicas. A próxima falha está na coordenação do curso, que nem ao menos certifica (isso pode ser feito depois com um processo de avaliação, falo sobre isso adiante) se o planejamento do docente estava correto. Então vemos como conseqüência, trabalhos repassados pelos professores normalmente excederem a carga horária de estudos e promoverem pouco aprendizado do conteúdo da disciplina, uma das principais  conseqüências de um planejamento ineficaz. 

Não sei porque o professor, que utiliza atividades práticas baseadas em código de programação, não utiliza os requisitos do trabalho e mensura a produtividade do aluno com o cálculo de pontos de função. É muito fácil e se ensina APF em quase todos os cursos de graduação, por que não utilizam?. No caso de trabalhos teóricos, como os artigos científicos, é mais fácil mensurar pelo conhecimento do professor sobre o tema, bastando dividir no seu cálculo o processo natural de composição de um texto: busca, leitura, escrita, revisão e finalização de acordo com a complexidade do tema. Por isso, ao planejar as aulas e atividades o docente saberá das dificuldades do aluno e promoverá condições para o aprendizado, do contrário ele criará mais filtros para reprovar os alunos.
No Brasil é normal haver filtros ao longo da trajetória de um curso de graduação (e pós) e geralmente não vejo uma avaliação cuidadosa dos alunos reprovados. Talvez isso seja porque o foco principal do ensino seja o CV lattes dos docentes, pelos artigos que ele publica com um determinado fator de qualidade. Então a forma de avaliação do ensino em uma universidade pública federal, infelizmente, é inexistente e o docente é livre para repetir a mesma forma de avaliação de séculos atrás. 

A ausência de uma avaliação do trabalho docente permite que o professor seja livre para estabelecer seus filtros, onde geralmente predomina-se a lei dos mais fortes (os que conseguem aprender sem a necessidade de um professor). Os mais fortes são a minoria, cerca de 20% dos alunos, segundo um estudo apontado no WEI-2012 , o que significa que a longo prazo apenas aqueles que não necessitam de professores serão os candidatos a diplomação, e conseqüentemente trabalhadores com melhor remuneração e qualidade de vida. Assim, executa-se nas universidades brasileiras um sistema de avaliação cruel e injusto, pois não se ensina apenas filtra-se os bons alunos. 

Aí eu pergunto a você: o que vai acontecer com os outros 80%?, o que será de um jovem que não teve oportunidade de aprender?. Você sabe, olhe nas sinaleiras, nas cracolândias da sua cidade e nos presídios para começar. Se não acredita em mim, continue lendo abaixo e veja a minha indicação de filmes.
 
Mesmo um bom aluno (dentre os 20% que não necessitam de um professor) precisa muita vezes assumir o risco de aprender e levar notas baixas porque não concorda em decorar simplesmente o que o professor quer ver nas provas. Cito o brilhante Steve Jobs, que obteve várias notas baixas e largou a universidade em busca do conhecimento sozinho e o caso da FedEx, cujo o Fred Smith também obteve nota baixa no projeto de conclusão de curso e construiu a maior frota de aeronaves do mundo. Fico pensando em outras áreas como medicina, biologia, biotecnologia, etc... poderíamos ter avanços significativos para resolver problemas complexos da humanidade. Nesses casos uma nota alta significa seguir na pesquisa e aceitar o modelo educacional que é oferecido. Isso é muito frustrante para pessoas que buscam desafios, porque nos casos citados, os autores relataram claramente que desejavam resolver os problemas da sociedade e não apenas tirar notas altas ou ser o primeiro da classe. Sem dúvida, os estudantes que vivem no século atual aprendem como no século passado e me pergunto sempre se um título de graduação de um cientista da computação do século atual vale realmente menos que um diploma de Phd de um século atrás, precisamos refletir muito sobre a forma de ensino atual, principalmente a forma de atualização e valorização dos professores (meritocracia) conforme o prof. Adonai também relatou no artigo.  
Para um melhor entendimento sobre  que escrevi até agora, recomendo o filme "Pro dia Nascer Feliz" que é um documentário premiado sobre a realidade do ensino no Brasil. Com certeza muitos irão se reconhecer nesse documentário e entender melhor as consequências desse filtro. Também recomendo, por conta do espaço limitado, entender como funcionam os filtros do ponto de vista dos alunos de computação no ensino superior
É muito fácil perceber a existência dos filtros, eles são criados a partir de uma consciência pessoal do professor, cuja a falta de integração social, política, econômica e educacional nas universidades reforça para que ele seja sempre negligenciado. É muito importante identificar os professores nível 1,2 ou 3 (classificação retirada da última recomendação), não apenas para punir, principalmente ajudá-los a alcançar o nível 3 ou até mesmo desfazer o erro de que não possuem aptidão para docência, pois acredito que muitos são levados muito mais pela “segurança” do serviço público. Também, ao assistir os vídeos fiquei pensando sobre quanto tempo é necessário para se formar um professor nível 3 e quais funções poderiam ser definidas ao longo desse caminho. E os professores 1 e 2 atuais, como podemos ajudá-los para aumentar o número de professores nível 3?. Sem dúvida podemos acrescentar várias questões, mas eu acredito que o princípio de tudo é a avaliação, não podemos mensurar o que não medimos. Vejo muitos professores nível 1 e 2 ficarem preocupados com a existência de uma avaliação docente, por isso acho que a universidade deve, primordialmente, dar condições de serem nível 3. 

Poderia existir um programa de excelência docente de acordo com as condições de cada campus, indicando: 
  • (i) disciplinas que eles sejam capazes de lecionar com base em avaliações discentes;
  • (ii) redução das suas turmas; 
  • (iii) apoio em cursos de qualificação; 
  • (iv) estabelecer parcerias entre professores de todos os níveis realizando seminários de docência; 
  • (v) monitorando as avaliações; e 
  • (vi) incluindo a avaliação discente. 
Com base nas avaliações poderia se atrelar bônus maiores de acordo com o rendimento do professor (olha a meritocracia de novo!), se não me engano essa é a vontade do MEC e da maioria dos bons professores.  Então é preciso haver uma coordenação para implantar e monitorar esse programa nas universidades. 
Existem modelos prontos, porém não podem ser facilmente adaptados por conta da singularidade de cada campus, no entanto é possível, pois vejo alguns fragmentos pelo país. Em uma matéria publicada no mês passado, o prof. Gilson Volpato descreveu em uma entrevista para o Jornal do Brasil que o principal motivo dos erros em artigos científicos no Brasil é que a redação científica ainda representa o calcanhar de Aquiles de muitos pesquisadores brasileiros. E os erros cometidos ao escrever uma tese ou artigo científico estão muito mais relacionados a problemas de metodologia de pesquisa do que à falta de habilidade com as palavras para apresentar os resultados de forma clara, concisa e interessante. É necessário ter uma compreensão muito clara sobre o que é fazer ciência para realizar boas pesquisas, que resultem em artigos sólidos para serem publicados em revistas de alto nível. A falta de comprometimento dos docentes no planejamento de suas aulas aumenta ainda mais a falta de suporte para a própria evolução científica do país. O prof. Gilson Volpato adotou um modelo de redação científica itinerária, onde percorre as universidades para formar bons redatores que repassam seus conhecimentos através de hubs de escrita científica. Uma iniciativa única no país, que deveria ser replicada em todas as universidades brasileiras.

Notei outros modelos após ler diversos comentários dos alunos do programa ciência sem fronteiras. Percebi que lá fora os estudos dão ênfase a utilidade prática, que em primeiro plano melhora o entendimento e aumenta o interesse do aluno pela disciplina. O projeto pedagógico lá fora é levado tão a sério ao ponto do professor marcar horários de atendimento para alunos de graduação. Há uma carga horária de estudos muito bem planejada para manter os alunos sempre interessados no conteúdo das disciplinas, onde há equilíbrio para que ele estude todas por igual e um aprofundamento dos estudos por interesse do próprio estudante. Existem avaliações discentes após o término de cada aula, o que enfatiza um verdadeiro compromisso com a melhoria do ensino, pois eles sabem claramente que o sistema antigo (estudar apenas para tirar boas notas) é inútil e não gera aprendizado duradouro. Bem que poderíamos ter esse compromisso no Brasil...

Outras sugestões de leitura sobre o assunto (lista em constante atualização):
Jornal da Ciência
Blog do prof. Adonai
Sítio do prof. Gilson Volpato 
Blog do prof. Palazzo
Diplomatique (Le Monde Brasil)
Blog da Dra. Suzana Herculano 
Quem Quer ser Professor? Atratividade, seleção e formação docente no Brasil
A Evasão Estudantil no Ensino Superior Brasileiro
A civilização escolar como projeto político e pedagógico da modernidade: Cultura em classes, por escrito 
Na Revolução Francesa, os princípios democráticos da escola pública, laica e gratuita: o relatório de Condorcet.
Medidor de Absenteísmo do Corpo Docente (Faltômetro)   
38% dos estudantes de graduação no Brasil são analfabetos funcionais
Universitários desenvolvem portal que mapeia verbas destinadas à educação no Brasil
Computer science education done right: A rookie’s view from the front lines at Princeton
La Educación Prohibida (Filme Argentino)
Perfil da Produção Acadêmica dos Programas de Pós-graduação em Computação no Brasil (2004-2009) 
Dinâmica de Coautoria dos Programas de Pós-graduação em Computação no Brasil 
Formação de Professores para o uso da Informática nas Escolas: Evidências das Práticas
Comissão de Informática na Educação da SBC 
Novos Rumos para as Universidades Brasileiras com Naomar de Almeida Filho (Vídeo do Colóquio de Junho de 2012)
On the Cruelty of Really Teaching Computer Science(E. W. Dijkstra Original Transcript 1988)
Brazilian Computer Science Research: Gender and Regional Distributions
Network of collaboration among PC members of Brazilian computer science conferences
Scientific Production in Computer Science: A Comparative Study of Brazil and other Countries
Assessing the Research and Education Quality of the top Brazilian Computer Science Graduate Programs
Ranking in Collaboration Networks Using a Group Based Metric 
Group and Link Analysis of Multi-Relational Scientific Social Networks
Dados Estatísticos da Base de Currículos de Pesquisadores e Docentes Brasileiros - Painel Lattes CNPQ
How People Learn 
What College Could Be Like (escrito pelo Communications of the ACM 01/2013)
 

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

    Pesquisas que investigam as condições de orientação, a qualidade do relacionamento entre orientador e orientando e os impactos desse relacionamento na vida dos orientandos são escassas. Além disso, os programas de pós-graduação enunciam descrições imprecisas e vagas, sem a apresentação de quais seriam as funções, atividades, deveres e condutas de orientadores e de orientandos. Assim cada orientador acaba desempenhando suas funções à sua maneira, como lhe convém, guiando-se por experiências passadas ou por justificativas carregadas de juízos de valor. 
    r
    É preciso ter bastante atenção, pois o título de doutor não assegura o domínio das aptidões necessárias para o processo de orientação, nem todo doutor é pesquisador, na verdade a grande maioria dos doutores encerra sua carreira de pesquisador ao obter a titulação. Um pesquisador é um profissional que desenvolve com regularidade a atividade de campo dentro de um processo continuado de geração de conhecimento ao longo de sua vida acadêmica. Apesar da experiência em pesquisa, não se pode esquecer que o processo de orientação não se restringe a parte metodológica. Por isso, pode ser muito interessante adotar modelos de orientação em cursos de graduação e pós-graduação e/ou treinar docentes para se tornarem mentores ou líderes.
    y
    Modelo de Orientação Baseado em Mentoria.
    t
    Modelo de Orientação Baseado em Liderança.
    t
    Os modelos apresentados foram baseados em uma pesquisa* com orientadores de mestrado e doutorado, cujo objetivo era apontar soluções para melhorar a qualidade da orientação dos docentes. Se existe algum modelo adotado na sua universidade, você é um dos poucos que não vai precisar dessas 10 dicas para escolher um orientador:
    1. escolha um orientador pela experiência de orientação e escrita científica. Um bom orientador deve ter autonomia de pesquisa depois do doutorado, propondo e participando de projetos de pesquisa, além de possuir publicações individuais.
    2. desconfie se ele é co-autor em muitas publicações depois do doutorado.
    3. pesquise informações sobre o orientador com ex-alunos, professores e alunos de graduação.
    4. desconfie se o seu orientador concluiu o mestrado em mais de 2 anos e doutorado além de 4.
    5. desconfie caso seu orientador não esteja supervisionando graduandos, pode ser um sinal que ele é um péssimo professor.
    6. desconfie quando seu orientador apenas elogia o seu trabalho e não critica seus relatórios de forma aprofundada, ele pode não estar lendo nada do que você escreve.
    7. mantenha-se firme com os problemas e seja transparente com a coordenação informando-a desde o início qualquer problema com a orientação.
    8. troque de orientador imediatamente caso não tenha confiança na orientação ou não tenha um plano de trabalho nos primeiros meses de curso.
    9. não perca tempo com um orientador ruim, troque logo no início para não correr o risco de perder o prazo da qualificação.
    10. comunique a pró-reitoria de pós-graduação da sua universidade se a coordenação do programa for conivente com tudo isso.
    *A maioria dos orientadores não sabe orientar, é o resultado de uma pesquisa apresentada no ENANPAD em 2008 http://www.faculdadefepam.com.br/wp-content/uploads/2012/12/Silva-L.B_Mentoria-e-Lideranc%CC%A7a_ENANPAD_2008.pdf
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